sábado, 12 de setembro de 2009

Fato (Verídico, como todos o são)

Não acreditava que pessoas pudessem ter um sexto sentido. Até ontem.

Já há aguns anos eu resolvi o que queria fazer da minha vida. Entrei na faculdade certa e comecei a produzir, mesmo que de forma lenta. Corri atrás de anos que perdi sem ter o incentivo certo.

Acho que isso tudo não pode estar estampado na cara de uma pessoa, por isso a história do sexto sentido. Estava eu sentado no banco da praça tirando minha hora de almoço, após comer uma bela feijoada. Eis que vem vindo um senhor, de aproximadamente 60 anos, magro, baixinho, vestindo uma camisa de candidatura da década passada. Até aí tudo bem. Ele pára na minha frente, permanece uns 20 segundos olhando pra minha cara e pergunta se poderia sentar do meu lado. O banco é público, que mal aquele senhor poderia me fazer? Ele sentou e ficou olhando fixamente pra mim. Então, soltou a pergunta que jamais esperaria que ele faria: "Você gosta de ler?"

Sempre fui pára-raio de maluco, mas nunca tinham me feito essa pergunta. Respondi que sim. Ele respirou, pensou, olhou pra mim e perguntou qual era o meu autor preferido. Em outra situação eu já teria feito como a maioria das pessoas, deixaria ele falando sozinho e saía dali. Foi então que suspeitei que se tratava de um senhor desses carentes de prosa. Dei a prosa. Falei que era difícil falar um, mas escolhi o melhor de todos, pensando que talvez esse rendesse pouco assunto e logo eu poderia ir trabalhar. Machado de Assis.

O senhor fez uma cara de "ihhhhh, logo esse". Não entendi a reação. No primeiro momento achei que ele não conhecia. Então, a primeira surpresa: "Essa história do Bentinho e da Capitu... isso é coisa de gente fofoqueira!"

Genial.

Troquei uns dez minutos de crítica sobre Machado com meu mais novo companheiro literato. Discutimos variados aspectos de Capitu e como Machado foi genial em não dizer se ela traiu ou não, deixando uma das maiores dúvidas da literatura brasileira (quisá a maior).

Percebi que já tinha dado a minha hora e ameacei me despedir. O senhor olhou pra mim e disse minha segunda surpresa, essa a maior de todas: "Você deveria ser escritor ou crítico literário."

Arregalei os olhos, totalmente incrédulo no momento.

Disse a ele que já era escritor, crítico ainda não. Quem sabe um dia. Ele não se espantou. Me despedi, já aflito para voltar a trabalhar. Ele me fez um pedido que me confirmou a hipótese de ser um senhor carente de prosa: "Você tem mais 5 minutos pra gente prosar?"
Falei que não, com um certo aperto, e saí rumo à empresa.

Ninguém tem a sua profissão estampada na cara. Será que ele perguntava aquilo a todos, na expectativa de começar uma conversa? Será que ele dizia a todos que deveriam ser escritores ou críticos literários?

Prefiro acreditar que aquele senhor tinha o verdadeiro sexto sentido da prosa.

Abraços pra que fica,

Guto Pina

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